O compromisso com a reconstrução e a resiliência do Rio Grande do Sul guiou a entrevista concedida pelo governador Eduardo Leite à Associação dos Grupos Regionais de Comunicação do Estado (ADI Multimídia), na segunda-feira, 5, em Porto Alegre. O encontro, organizado pela Secretaria de Comunicação (Secom), reuniu representantes de 30 grupos regionais de imprensa e marcou um ano da tragédia climática que atingiu diversos municípios gaúchos.
Na ocasião, Leite fez um balanço das ações desenvolvidas pelo governo estadual após as enchentes históricas de maio de 2024. Ele ressaltou o papel estratégico do Plano Rio Grande, programa que orienta medidas de reconstrução, adaptação e enfrentamento de eventos climáticos. “Vamos tornar o Rio Grande ainda mais forte e preparado para o futuro”, afirmou.
O governador apresentou os investimentos já realizados, como os mais de R$ 1 bilhão aplicados em dragagens e desassoreamento de rios, e outros R$ 2 bilhões na recuperação de rodovias estaduais afetadas. Também destacou os projetos habitacionais voltados à construção de moradias definitivas em áreas seguras.
Na área da prevenção, Leite apontou avanços como a instalação de radares meteorológicos, a reestruturação da Defesa Civil, e a contratação de estudos sobre bacias hidrográficas. O governo também está auxiliando municípios na revisão de seus planos diretores, com o objetivo de planejar ocupações urbanas mais seguras e sustentáveis.
No setor agrícola, o governador relembrou os desafios impostos por estiagens e frisou medidas como a dispensa de licenciamento ambiental para irrigação, além do programa Irriga Mais, que oferece até R$ 100 mil em subsídios para projetos de irrigação. Também anunciou o Programa de Recuperação Socioprodutiva, Ambiental e de Resiliência Climática da Agricultura Familiar Gaúcha, aprovado na Assembleia Legislativa, que prevê repasse de até R$ 30 mil a pequenos produtores para recuperação do solo.
Sobre as concessões rodoviárias, Leite defendeu o modelo de pedágio free-flow, afirmando que ele possibilita tarifas mais justas e garante os investimentos necessários para segurança e qualidade das estradas. Em relação ao futuro político, o governador confirmou que pretende disputar a Presidência da República em 2026, apresentando-se como alternativa à polarização nacional. Caso a candidatura não se concretize, considera a possibilidade de concorrer ao Senado. Durante a entrevista, também manifestou apoio ao vice-governador Gabriel Souza como possível sucessor no governo estadual.
Há um ano, neste mês, vivíamos um dos momentos mais dramáticos e desafiadores da história do Rio Grande do Sul. Hoje, quais são as ações prioritárias do Governo na reconstrução do Estado?
(Eduardo Leite) O Plano Rio Grande – que pode ser acompanhado pelas redes e no portal planoriogrande.rs.gov.br – se propõe a tornar o Estado mais forte. Esse plano inicia imediatamente com a prioridade de resgatar vidas; em seguida, entram as ações emergenciais, com assistência às famílias e aos municípios impactados. Uma das iniciativas foi o programa Volta por Cima, que colocou cerca de R$ 250 milhões do Governo do Estado na mão dos mais impactados (R$ 2,5 mil para cada família). Em seguida vem o restabelecimento e a reconstrução, fases em que o Estado realiza contratações. Algumas ações avançam mais rapidamente e outras levam mais tempo, pois são projetos mais complexos, mas estamos evoluindo.
O programa Desassorear RS disponibiliza R$ 300 milhões em maquinários, que estão sendo utilizados em dezenas de municípios simultaneamente, a partir dos projetos que os prefeitos nos apresentaram, para fazer a limpeza, retirar a sedimentação dos rios e permitir melhor curso das águas para evitar enchentes – além de outros R$ 700 milhões para dragagens nas hidrovias gaúchas. Somente nesses projetos, há um investimento de mais de R$ 1 bilhão.
Nas estradas do Rio Grande do Sul foram executados trabalhos por meio dos nossos contratos de manutenção e conservação, que permitiram que 94% das rodovias estaduais fossem liberadas para o tráfego. Também tivemos ações mais complexas. Um exemplo bastante exitoso de recomposição foi da ponte entre Lajeado e Arroio do Meio, no Vale do Taquari. A execução da obra levou sete meses – um prazo bastante rápido para a complexidade daquela obra. Para outros tantos pontos, organizamos lotes de rodovias – pelo menos 15 já contratados, e vamos chegar a mais de 20 –, em que serão investidos mais de R$ 2 bilhões na recomposição integral das rodovias. Agora, no mês de maio, início de junho, o Daer deverá fazer análise desses projetos, e as empresas já entram em campo. Em alguns lugares já estão iniciando trabalhos preliminares, mas as obras mais robustas vão começar a aparecer a partir dos meses de junho e julho. Não estou falando de tapa-buraco ou pequenos reparos; é refazer rodovias inteiras. Além de refazer, torná-las mais resilientes.
Além disso, temos a demanda por moradias, que envolve, muitas vezes, a identificação e compra de uma área, a desapropriação e a construção de projetos que não havia antes. Então, tudo isso também já começa a aparecer, como as moradias definitivas em Santa Tereza e Encantado, além das moradias provisórias, que foram um caminho para dar dignidade ao acolhimento das famílias atingidas, que estavam vivendo em abrigos. As moradias provisórias já nos permitiram reduzir muito o número de abrigos e praticamente fechá-los na maior parte dos municípios.
Prevenção é palavra de ordem. Em um ano, quanto se avançou na implementação de sistemas de prevenção e de monitoramento para que possamos nos preparar para futuros eventos extremos climáticos e, de que forma o Estado vem auxiliando as prefeituras neste trabalho?
(Eduardo Leite) A prioridade é proteger e garantir vidas. Como fazemos isso? Com sistemas de alertas mais robustos. Esses sistemas envolvem a instalação de equipamentos como radares meteorológicos. O Estado não tinha radares próprios; usava as informações disponíveis por radares da Aeronáutica, por exemplo. Nós já contratamos um primeiro, instalado na Região Metropolitana, com cobertura ampla do Estado, mas vamos instalar outros três radares que estão sendo contratados.
A reforma e a manutenção das estações hidrometeorológicas existentes já foram encaminhadas, o que nos ajuda a ter uma leitura adequada das condições das chuvas. Além disso, estamos contratando, neste mês, serviços de batimetria e topografia. A partir disso, outro estudo que será contratado é o de modelagem hidrodinâmica. Quando se associa tudo isso – radar, estação hidrometeorológica, estudos dos rios e da topografia, modelagem hidrodinâmica – conseguiremos, em breve, emitir alertas mais precisos para a população.
Além disso, estamos contratando equipamentos – helicópteros, viaturas, botes – para a Defesa Civil, Brigada Militar e Corpo de Bombeiros, que são a nossa força de resposta para entrar em campo quando necessário. Precisamos ter nossa própria capacidade de resposta.
A proteção das cidades envolve sistemas mais complexos, mas também estamos trabalhando neles. Estudos para as bacias do Taquari-Antas e Caí estão sendo contratados. Em outras bacias, como a do Rio dos Sinos e do Gravataí, estávamos em fase mais adiantada, porque o Estado já vinha promovendo estudos. Os projetos para a cidade de Eldorado e para o Arroio Feijó (Alvorada e Porto Alegre) já estavam em fase mais avançada e estão sendo revisados.
É importante mencionar que há o acompanhamento de um comitê científico que o Estado constituiu. São 41 especialistas – entre geólogos, hidrólogos, meteorologistas e engenheiros – que acompanham todas as ações que estão no Plano Rio Grande para garantir que tudo o que está sendo feito realmente contribua para tornar o Estado mais forte.
As ações incluem a revisão do Plano Diretor dos municípios atingidos?
(Eduardo Leite) É mais uma iniciativa. Contratamos, por exemplo, para o Vale do Taquari – região especialmente afetada – a Univates, para fazer a revisão dos planos diretores, porque nem sempre a solução, como dizem os especialistas, é estrutural (erguer um dique, por exemplo). Eventualmente, é sobre induzir o desenvolvimento da cidade para regiões mais seguras. Especialmente depois de um desastre como esse, em que regiões inteiras foram devastadas, trabalhamos com a lógica de poder ajudar os municípios a desenvolver os espaços que as pessoas vão ocupar em locais mais seguros, enquanto aquelas localidades atingidas se tornam áreas de uso restrito. Serão parques, por exemplo, que ajudarão a retardar a velocidade da enxurrada, preservando aquela região e as localidades adjacentes da força das águas.
Além da enchente histórica, que tornou milhares de hectares de terra improdutivos, ciclos de estiagem também desafiam os agricultores nesses últimos anos. De que forma o Estado vem trabalhando para auxiliar e dar respostas aos produtores?
Tudo o que depende do Governo do Estado, nós estamos buscando fazer. Para a questão das estiagens, trabalhamos na facilitação do licenciamento para fazer irrigação. Não é mais preciso licenciamento para a instalação de pivôs, por exemplo. Além disso, abrimos espaço para que seja de competência dos municípios o licenciamento de açudes e barragens de até 25 hectares, o que multiplica a capacidade de licenciamento, antes concentrada no Estado, gerando um gargalo para atender toda a demanda.
Também criamos o programa Irriga Mais, em que o Estado subvenciona projetos de irrigação em até 20% (com limite de R$ 100 mil). O produtor rural que quiser investir em irrigação tem licenças mais fáceis e acesso a recursos do Estado. Não é um financiamento; o Estado paga até R$ 100 mil diretamente. É um prêmio, porque interessa ao Estado que se amplie fortemente esse processo de irrigação.
Também estamos com um novo programa – aprovado na terça-feira, 6, na Assembleia Legislativa – para viabilizar a recuperação de solos [Programa de Recuperação Socioprodutiva, Ambiental e de Resiliência Climática da Agricultura Familiar Gaúcha]. Vamos colocar na mão de milhares de produtores rurais um cartão em que ele terá aproximadamente R$ 30 mil (por propriedade) para compra de insumos necessários para fazer a recuperação do solo [...].
O que o Estado pode fazer está sendo feito, mas também precisamos que a União faça a sua parte. Estamos buscando uma mobilização dos agentes políticos e dos setores produtivos para sensibilizar a União na direção de repactuar as dívidas e dar fôlego para que os produtores possam fazer seus investimentos. Foram, nos últimos seis anos, pelo menos quatro estiagens muito severas, além das enchentes que afetaram a produtividade no campo.